O primeiro foral concedido a Tavira por Afonso III (1266) consagrou a criação da chamada Quinta D’El Rey, que fazia parte do chamado Reguengo de Tavira que era o nome que se dava ao conjunto de todos os bens reservadas por sua majestade no texto do dito foral. Deste reguengo estavam também incluídos os pertences do anterior governante mouro de Tavira, Ibn Fabilah, para além das salinas, moinhos, lagares e vinhas do dito líder mouro.
Todos os bens produzidos nessa quinta eram pertença do soberano, e livres de impostos. O que aconteceu durante algum e até à venda da dita Quinta a particulares é que a Quinta foi sendo aforrada (ou concessionada) a diferentes individualidades, como Fernando Álvares Pereira (séc. XIV), irmão do famoso Nuno Álvares, e mais tarde a alguns elementos da família Corte Real original de Tavira, primos afastados do santo condestável (século XVI a XVII). Da família Corte-Real transitou para a Condessa da Calheta já no século XVII. Daqui foi doada às irmãs de Santo Alberto (Anica, 1993), com convento em Lisboa, por via do facto da condessa ter entrado para o referido convento. Daqui transitou para outro proprietário, em 1771 pertence ao magistrado tavirense João Leal da Gama e Ataíde, ficando nesta família até 1854 quando a descendente a vende a José de Conceição Camacho e Luís António Teixeira Peres (Anica,1993). Estes por sua vez foram trespassando o terreno a outras individualidades, até que a Câmara a compra em 1960 , para dar início à urbanização daquela zona rural em plena cidade .
A fotografia que se divulga aqui dá conta do momento do actual Tribunal em Tavira, por volta dos anos 60, julgo. Como se pode bem ver, para além da omnipresença do telhado de tesouro, temos a construção de um edifício moderno, que se destaca, destinado a funções administrativas do Estado em plena zona verde da cidade.
O que ressalta sobretudo é uma ilha de casas modernas construída já durante o século XX que se encontra completamente rodeada pelo casario mais antigo que subsistiu na cidade. A Casa da Justiça de Tavira, o enorme prédio de dez andares que esteve anos por ser terminado do outro lado da rua Silvestre Falcão e que deixou um grande buraco à vista pelos alicerces durante o meio dos anos 80. Todas aquelas casas que vão até às traseiras do antigo Hospital do Corpo Santo (actualmente o colégio da Misericórdia) até à entrada principal do Quartel Militar da Atalaia pertenciam a este espaço agrário reservado a sua majestade, para Leste ele era limitado pela Rua do Montalvão e por Norte pelas casas que se vêm na foto, da antiga Rua Nova Grande, actualmente Rua da Liberdade.
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Mês: Junho 2017
Fortes, muralhas e castelos para proteger dos males que vêm do mar
Diziam os astecas quando viram a chegada das naus castelhanas vindas do mar comandadas por Hernán Cortez em 1521 que se concretizava a profecia da vinda do seus Deus Quetzálcoatl, a serpente emplumada, que haveria de preparar o fim do Império Asteca. A costa algarvia podia não estar ameaçada pelos castelhanos, pois já era bem…
Diziam os astecas quando viram a chegada das naus castelhanas vindas do mar comandadas por Hernán Cortez em 1521 que se concretizava a profecia da vinda do seus Deus Quetzálcoatl, a serpente emplumada, que haveria de preparar o fim do Império Asteca.
A costa algarvia podia não estar ameaçada pelos castelhanos, pois já era bem conhecida deles, mas também não estava a salvo da investida de corsários e piratas esclavagistas mouros que gostavam de pilhar sobretudo as igrejas e os conventos locais e sequestrar populares para venderem como mão-de-obra escrava.
Não existem relatos concretos de investidas da pirataria moura, mas as mais antigas fortificações na zona da Ria Formosa, ao contrário das da linha da Foz do Tejo, não resistiram a maior parte delas em virtude do grande dinamismo deste troço da costa algarvia. De modo que as poucas fortificações que ainda subsistem são precisamente as que foram erguidas do lado interior da Ria, e não as que foram erigidas nos próprios cordões dunares.
Um dos mais antigos mapas conhecidos do Algarve, supõe-se que desenhado em meados do séc. XVIII, uma vez que Vila Real de Santo António ainda não surge nele, refere vários fortes na zona da Ria, alguns bem conhecidos e que sobreviveram (Rato, chamado de Forte Velho no mapa, São João da Barra, assinalado como da nova barra de Tavira e, finalmente, Cacela) e outros que foram submersos (São Lourenço) na saída para o mar dos portos de Olhão e Faro. Não são conhecidos mais fortes nas ilhas da zona de Faro que tivessem sobrevivido à erosão.

Excerto de mapa da costa leste algarvia de meado do séc. XVIII.
Na cartografia dos espaços fortificados existentes em finais do século XVIII é de destacar o papel do engenheiro militar José Sande de Vasconcelos. Responsável pelo governador militar do Algarve por inventariar o estado de todas as baterias e fortificações costeiras, para além de ter estado envolvido na construção do Quartel da Atalaia em Tavira e na edificação do zero de Vila Real de Santo António, histórias que ficarão para desenvolver noutras oportunidades. Para além de referir as mais bem conservadas : que são do Forte de Santo António (ou do Rato) em Tavira, São João da Barra em Cabanas e o Forte de Cacela. O denominador comum destes fortes é o mesmo: eles foram erigidos para defender a margem interior terrestre da Laguna das investidas de um atacante pelo mar consoante a localização da Barra Natural na época de construção: enquanto que o forte de Santo António foi erigido em meados do século XVI, pouco antes da malograda aventura de Alcácer Quibir, o de São João da Barra (que conserva no nome a origem da sua localização, foi terminado após o fim da guerra da restauração que se seguiu ao 1º de Dezembro) onde perto veio a crescer a povoação de Cabanas de Tavira e finalmente o forte de Cacela, erigido mais tarde quando o prolongamento do cordão dunar tornou necessário também a existência de uma fortificação. Para mais, a fortificação de Cacela é um elemento moderno numa porção de uma povoação que perdeu população e que era sede de concelho que separava Tavira de Castro Marim (extincto pela criação do concelho de Vila Real). É de crer que no passado Cacela seria defendida por um poderoso castelo de maior dimensão: o castelo de Cacela que foi conquistado aos mouros pelos cavaleiros da Ordem de Santiago. Continuar a ler “Fortes, muralhas e castelos para proteger dos males que vêm do mar”
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